quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

874 - porque eu carrego rápido o coração


enquanto passam os anos
eu escrevo apressado
sobre coisas que não vivi

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

873 - porque eu vento ágil o coração


alegra-me a palavra indomada
que de súbito
arisca-se em alvoroço

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

872 - cantata profana para ébrios mares


vinde estações,
açoitar-me a proa do peito
que hoje estou velas a incitar
não há porto que me detenha
empunho-me sal, só e sóis
vinde estações,
que de horizontes me cerco
para o sobressalto do sem fim

domingo, 26 de fevereiro de 2012

871 - Sonata de fortuna para o aprendizado das horas


meus olhos nada sabem
sobre o aprendizado das horas
transitam febris por teu corpo
numa espera insone de delírios

meus olhos nada sabem
e perscrutam com insistência
o rio que se derrama sobre
esse leito de alumbramentos

meus olhos nada sabem
sobre o aprendizado das horas
mas se contentam fartos sobre
tão ávido desconhecimento

sábado, 25 de fevereiro de 2012

870 - outra rapsódia insana para olvidos tristes


há um trajeto de viagem que incita sóis
como se os pés fossem folhas em elevação
e todo canto de pássaro se oferecesse solícito
para espargir o olhar nos girassóis distantes

há um trajeto de viagem que incita sóis
faz morada na brevidade de uns alísios
que percorrem fronte, cílios e omoplatas
e grudam como sal na mais fina epiderme

há um trajeto de viagem que incita sóis
é d’ouro que instila rútilos amanhecimentos
o alumbramento que se arvora em fotografias
e ficam no para sempre sedento das retinas

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

869 - rapsódia insana para olvidos tristes


antigas eram as notas
sons trespassados de olvido
o corpo já não obedecia o ritmo
que se instalava como estio

ofegantes as palavras
umedeciam a saliva

antigas eram as notas
o mistério imaculado no pretérito
quando o sangue era vertigem
e corriam os rios de algaravia 

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

868 - poema à guisa de uns rumores na alma


primeiro te ouvi como numa canção
depois foram nuvens de sorrisos
até que os olhos se viram girassóis
e tudo se eternizou em alvoroços

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

867 - minueto embevecido a perscrutar o voo da libélula


eras tão vertigem quando me vinhas
e acomodavas tuas simpatias
bem no centro dos meus olhos

eu ficava tão inerte em tuas mãos
eram elas que guiavam em procissão
por tontas celebrações em teus altares

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

866 - poeminha breve de vanguarda apressada


eu já tentei tantas formas
de inventar um poema
que quase esgotei a linguagem:
não deu em nada
tudo morre na palavra

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

865 - poeminha apressurado de manhãs


tão rápido se fez o sol
que não percebi tuas mãos

repentinas e distantes
a se imiscuírem no arrebol

domingo, 19 de fevereiro de 2012

864 - Poeminha retirado da velha algibeira


Não sou feliz
Não me venham com branduras
Eu nunca vou ser feliz
Pelo menos não neste poema


* Parceria com Cris no Válvula: aqui

sábado, 18 de fevereiro de 2012

863 - auto de invocação para espinhos e saudades VII


no meu leito de tão vastas saudades
adormecem pássaros para adornar espinhos
todo pranto é um voo alquebrado
já não há a suntuosidade dos teus silêncios
com eles eu almejava aldebarã
era múltiplo e rico o meu baú de vazios


*A Teca fez aniversário do blog e eu ganhei presente aqui

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

862 - auto de invocação para espinhos e saudades VI


há passos e letargia em tua ausência
que transborda nos lençóis
e os espelhos deduzem o sobressalto
assim:
até os olhos cansarem de tanto silencio

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

861 - auto de invocação para espinhos e saudades V


eu me ponho a mercê dos lábios teus
que ávidos sugam de súbito todo sal
desconcertam paisagem e geografias

dilaceram sentidos da palavra primeva
para instaurar rotas: hodiernas grafias

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

860 - auto de invocação para espinhos e saudades IV


Eu me debruço sobre a tua geografia de abismos
És-me o horizonte das mais castas incertezas
O arredio caminho de rútilas incoerências

Sobre as tuas espáduas florescem os efêmeros
A misteriosa ascensão de girassóis e relâmpagos  

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

859 - auto de invocação para espinhos e saudades III


eu me atiço de preâmbulos
quando surges em rapsódia
como num assombro de mar


e os espinhos regurgitam
o desembaraço das horas

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

858 - auto de invocação para espinhos e saudades II


eu despreparo as redes
que outrora habitávamos
havia nelas tantas iscas
ilhas vazadas de riscos

domingo, 12 de fevereiro de 2012

857 - auto de invocação para espinhos e saudades


minha solidão ainda
não se acostumou
com a tua ausência


há uma inquietude
de pássaros no
vórtice deste silencio

sábado, 11 de fevereiro de 2012

856 - poeminha de açoite para corpos celestiais


em que acesso de veneta
vinhas rota em ruas nuas
noiva em frase, face, fase

quase relâmpago encanto
de quando outras vicejava
de tuas luas gula, espanto








sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

855 - berceuse de invitação a pasárgada VI

quando o caramujo submerge em interior
minhas crisálidas vistas se desapegam
festejam em mim relâmpagos de alforria

uma chuva me habita de tanta incerteza
que me compartilho em um vicejar alado
me correm ásperas as armadilhas do dia

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

854 - berceuse de invitação a pasárgada V

antes que ao inverno chegues
e as aves cantem seus ninhos
permita-me ouvir teu passo liso
que se alimenta de chão e terra
e vem fazer morada neste olhar
que entorna saudade e desterro
permita-me a flor e o desespero
deste ir e vir no vórtice da tarde

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

853 - berceuse de invitação a pasárgada IV

traga-me uma concha de vento
que hoje espraio minúcia de arrebol
tenho um corolário de insanidades
para colorir as frases mais tenras

se me invadem estrelas ah eu urro
debato-me na chaga do pretérito
anseio albatrozes para vicejar
vivo de irmanar-me aos destroços

trago-me em colcha de inventos
suspiro deidades em lira e assovio
velo o pássaro sem altivez de voo
a minha rota é ascensão de nuvem

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

852 - berceuse de invitação a pasárgada III

já passou e era só a brisa
crisálida do instante
asa de peixe sobre a terra
morada de fauno
coito assustado de libélula
urro de mar languescido
já passou e tanto que era

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

851 - berceuse de invitação a pasárgada II

sou capítulo impaciente de uma odisseia
nuvem burlesca em céu de anil
nos meus olhos eclodem azáfamas

nenhuma correnteza me impele a salto
sou estuário delgado
para onde se precipitam os rios

domingo, 5 de fevereiro de 2012

850 - berceuse de invitação a pasárgada

queria que viesses ao meu silencio
beber umas vertigens
soprar as guirlandas no céu
repousar o tumulto dos dias

ficaríamos sobressaltados de nadas
até que o sol ensimesmasse a alvorada
e nossos corpos formassem uma só pele

sábado, 4 de fevereiro de 2012

849 - poema de intermitência para vazante dos olhos

o teu olhar derrama quimeras
atravessa-me de alegorias
provoca sustenidos

nenhum horizonte sustenta
o precipício que vaza
desse cintilar tão ávido

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

848 - suíte tosca para o não dizer da poesia III

o poema não se contenta de absurdos
almeja píncaros, procissão de nuvens
despeja-se neste raso que tudo inunda

o poema não quer sustentação de asas
alado se remói em um sustenido breve
eleva-se na quimera que o silvo produz

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

847 - suíte de sertania desencontrada III

encarece de soslaio as moitas no sertão
escarnece ajuntamento de muitas vidas
até o vento quando ali passa faz visita
por tantos olhos encantados de multidão

no tempo de eu menino gestava rebuliço
colocar toco de pau atiçando a touceira
meu pai dava castigo de gesto e mudez
para nunca mais a gente se repetir no ato

o mano certa vez se deparou na cascavel
que enraizada na toca chocava suas crias
correu até os olhos suarem roxo de medo
levou dias até se aventurar n’outra arrelia

nem sempre meneio se perdoa distração
contam de muita gente que no não saber
ficou definhando até o osso se exasperar
e morrer na ignorância do muito silencio

cumprem-se de resguardo essas veredas
para não excitar sibilos que se aguardam
também de bom alvitre é mesura no passo
pois quem sabe da trilha não oxida rastro

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

846 - suíte despretensiosa para súbitos desencontros

por um mínimo detalhe não nos cruzamos
numa avenida tresloucada de transeuntes
eu te olharia passar distraída em teu passo
quase despercebido de o sol não me notar
no meu inventário de gestos num caminho

tu trarias a saliva do lábio no sorriso táctil
a mão insuflada no laço em torno da bolsa
os teus olhos plantariam silêncios de ilhas
serias vertigem condensada de uma nuvem
tudo estaria em órbita no instante não vivido