segunda-feira, 30 de abril de 2012

935 - ária de soluço para terna incompletude


é tão vasto o desconhecimento
que me eternizo de vazios
dias sim, dias não, contento-me
a colar as pálpebras no horizonte
e ali depositar a saliva do silencio

domingo, 29 de abril de 2012

934 - ária dissoluta para léxico em extravio


nada viaja na palavra
nem o espanto
nem o silencio

quem sabe a saliva
bendita de uma
brisa em saliência

sábado, 28 de abril de 2012

933 - poeminha breve e assustado


o tempo comeu
minhas palavras:
rumino ausências

sexta-feira, 27 de abril de 2012

932 - pequeno retrato do artista em dissolução


recolho entulhos, sobras, escombros
imenso painel que nada há de edificar
poeira, desolação, artefatos de ruínas

tenho somente sílabas de destruição
este vento que me arde as têmporas
a solidão do corpo sem comiseração

o poema é o sexo que preciso imolar
a rota de desassossegos, turbulência
deste nada que germina no meu caos

quinta-feira, 26 de abril de 2012

931 - sonata de desamparo sob vento longínquo


às vezes me corrói o
desatino da ausência
haver que não existe:
lugar onde o silêncio
germina suas sílabas

uma terra sem orvalho
périplo de rio sem foz
seta de olho sem alvo
a súbita revelação da
inércia de uma palavra

quarta-feira, 25 de abril de 2012

930 - Poeminha raso sobre o sortilégio das distancias absolutas


penso em céu e palato,
em coisas próximas
e tão distantes,
nos nossos passos,
num regato, regaço,
vivo assim:
de abraçar a ausência,
de doar-me às brisas,
às sílabas e pétalas
do alvorecer.
nada me cabe
em contentamento,
mas anseio o por vir,
este oásis que
há de se cumprir.

terça-feira, 24 de abril de 2012

929 - poema para as vicissitudes de uma estação


(à guisa de um metaplagio de Drummond)

o mundo é tão grande, amor
não cabe na minha paixão
vivo de amar substantivos
verbos que não se conjugam
como pontes desoladas
estradas para lugar nenhum

o mundo é tão grande, amor
não cabe nos meus girassóis
há um horizonte que se quebra
em instigantes amanhecimentos
que correm feito areia nas retinas
e sulcam a face de tanto pretérito

o mundo é tão grande, amor
não cabe na minha distância
no desassossego dos passos
em árias e berceuses que intento
o mundo é tão grande, amor
que me detenho em teus braços

segunda-feira, 23 de abril de 2012

928 - prosa rasa de espanto e pertencimento II


na noite que tu vieste fazer vendaval
o mar era puro despertencimento
vagava em corais e desalinhos
e sob as nuvens do céu de abril
as naus intentavam solução de porto

na noite que tu vieste fazer vendaval
eu tinha nos olhos o farol da miragem
o peito se abria em velas ao horizonte
era tanto sal e areia a escorrer na face
que não tive ímpeto de saudar o súbito

domingo, 22 de abril de 2012

927 - prosa rasa de espanto e pertencimento


no dia em que eu estarei em ti
será o nunca mais da ausência
a reunião de todos quereres
em súbita e líquida anunciação

sábado, 21 de abril de 2012

926 - Pequeno retrato de alvorecer as madrepérolas


O recanto da ausência não faz ruído
Não há saliência de pálpebras
É arroio miúdo encharcado de pedras

Faz vez de bem querer neste silencio
A nenhumas de estar em entendimento
Intui-se assim a gramática das chuvas

O recanto da ausência é ilação de líquido
Um estado de dormência nas retinas
O tormento de se inquirir em ignorância

sexta-feira, 20 de abril de 2012

925 - Ária de levitação para seixo escondido na areia III


não há palavra que me salve da distancia
vazei o olhos para o girassol do horizonte
em todo porto há uma ânsia de despedida

a indelével mancha que me marca o peito
é seixo retorcido, alvoroço e mar de areia
não há palavra que me salve da distancia

não há sequer saliva para úmido do lábio
nem profundeza que germine ou abarque
mas a rota tosca desta miríade de versos

quinta-feira, 19 de abril de 2012

924 - Ária de levitação para seixo escondido na areia II


em pedra e silencio esculpi
a nomenclatura da nuvem
fiz do altiplano um léxico
mas era de tantos o vazio
que a nada havia de ardil

em pedra e silencio esculpi
a nomenclatura da nuvem
e o teu nome gravei na dor
como o rio em tempestade
como inventário da solidão

quarta-feira, 18 de abril de 2012

923 - Ária de levitação para seixo escondido na areia


respira em desatino a imperfeição da pedra
assim pousada, no soslaio de viço e silencio
feito pássaro que se empluma em altiplano
cegos nós que se corroem gesto e argúcia

em dois gumes também se afia pedra e paixão
do amor se espera o alado, regaço de nuvem
mas se arqueia de soçobro em vereda mineral
ferro e fogo se agitam em périplo de singeleza

terça-feira, 17 de abril de 2012

922 - poema de silencio e prece para levitação de nuvens


não sou mais eu mesmo desde que te percebi
agora me brota um vasto desconhecimento
a sensação atávica de deslocamento no mundo
antes me bastava a palavra para a completude
o arrebol que eu tecia com artimanha e sílabas
pois hoje todo o verbo se cumpre em ausência
nada significa sem o calor do sopro da tua voz
nem mesmo o fogo arde nesta pele castigada

segunda-feira, 16 de abril de 2012

921 - poema de sagração ao princípio do alvoroço


no gênesis original não existia amor
quem sabe junção de carnes, coito
mas o homem deu de olhar estrelas
e perceber-se em seu oposto, afoito

e de passear pelos astros o alvoroço
e sentir na alma o arrepio e o anseio
condoeu-se o céu de suma querência
assim se fez desatino em meio ao dia

quando o postar-se em contemplação
quando o levitar de brisas e assovios
juntou-se na ordem dinâmica da vida
e girassóis rugiram o norte em lilases

domingo, 15 de abril de 2012

920 - Berceuse para acalentar o viço de uma aragem


Transita-me o beijo como farol
A passagem de saliva e sílaba
O arroubo que umedece o sal

Transita-me a pele em fagulhas
Um arrepio de pelos em gládio
A desordenada conjunção de ais

sábado, 14 de abril de 2012

919 - Sonata de esmero para olhos em cascata


Ao acaso de um gesto
Ao sopro de uma brisa
Ao brilho de um lilás
Há vertigens e sinais

Ao esmero dos lábios
Ao desatino de braços
Ao lenço de sargaços
Há uma tiara de laços

Ao ornamento da face
Ao níveo da perfeição
Ao âmago da singeleza
Há luzes e constelações

sexta-feira, 13 de abril de 2012

918 - Canção de renovo para quimeras do alvorecer


Soluçam as têmporas nesta estação
Em cada palavra de breve outono
arqueja o alvoroço de tuas nuvens

foste o arroio, a enseada, o estuário
o princípio incandescente da saliva
os brotos d’uma incessante ventura

quinta-feira, 12 de abril de 2012

917 - La ventana de tus ojos


para Lara Amaral

sequioso por velas
empunho o arco
numa breve nota

a guelra respira
por essas janelas
que soçobram

o coração pousa
azul e apascentado
: monocórdico

quarta-feira, 11 de abril de 2012

916 - Poema de chuva sob céu a descoberto


Outrora me moviam os passos
Hoje são arrepios que conduzem
O vício de esperar a tua chegada

A precipitação do desassossego
Que inunda a solidão dos sentidos
Como a chuva que me corta a face

terça-feira, 10 de abril de 2012

915 - canção de esporas ao vento em corcel alado


no dorso voraz das tuas ancas
serpenteia a sede de amanhãs
o solilóquio recanto das palavras
a brevidade do mergulho insano
o perder-se que não desencontra
o amálgama de raios e desvarios 

segunda-feira, 9 de abril de 2012

914 - Canção inquieta de perfume e amanhecimento


os desígnios do teu olhar me atravessam
numa eternidade de chama em paixão
brisa e horizonte embevecidos de jasmim

há uma pausa que me inquieta a manhã
a tormenta de alguns segundos paralisados
como a antevéspera que incita o beijo teu

domingo, 8 de abril de 2012

913 - rondó de adivinhas para olhos, ouvidos e vozes


eu fico lendo os teus sinais,
esperando nalguma esquina
que tu possas surgir
com teu passo de deusa
e fazer dos meus olhos
um farol de alvíssaras

eu fico lendo os teus sinais
em cada por de sol
na brisa mínima da manhã
neste cheiro que emana
da pele que se queima
na chaga de uma paixão

eu fico lendo os teus sinais
nos sons desesperados
que inundam minhas ruas
por onde passeio atônito
meus passos de peregrino

eu fico lendo os teus sinais
em cada odu de um búzio
na predição das cartas
nos loucos mapas astrais
na direção torta e assustada
dos girassóis ensimesmados

sábado, 7 de abril de 2012

912 - rondó para altiplano e pomos imarcescíveis


fosse maçã nuas frutas encarnadas
em desespero de toque e encanto
sobre pele branca de nuvem e neve

fosse ímpeto, salto, rota de extravio
mão de anjo para render em preces
velas para imolar vagas em desafio

fosse inundação de saliva e arrepio
altiplano para suster-se em suspiros
o cândido, claro, níveo imarcescível

sexta-feira, 6 de abril de 2012

911 - uma canção de girassol, bordados e lilases


por onde eu me ia, se são tuas
as estradas do meu peito, se
através de tantos embaraços
teu porto se ancorou ao meu

por onde eu me ia, se os olhos
tão cansados vertiam a solidão
de muito rastro e descompasso
até me fazeres a rota, a bússola

quinta-feira, 5 de abril de 2012

910 - Berceuse inquieta para trôpego caminho


Repousa tua fronte nas minhas palavras
Que tecem paisagens, amanhecimentos,
E que sublimam o horizonte de arrebóis

Repousa flor o teu sexo na minha saliva
Permita que me doe em visgo e sílabas
E te cubra de lilases, jasmins e girassóis

quarta-feira, 4 de abril de 2012

909 - poeminha para alguns estágios físicos do desvario


o que havia de ti em pedra
se colou ao meu olhar
calou o que existia em flor
fez deserto,
fez areia,
fez o caos.

acho que por isso
te amo tanto,
meu amor

terça-feira, 3 de abril de 2012

908 - Poema de sargaço para levitação de velas


No teu corpo me alumbra o desígnio
De te cumprir um fado em alvoroço
Soçobrar gestos na languidez da pele
Esculpir os olhos na maciez da língua

No teu corpo me alumbra o desígnio
De te cumprir em bulício de paixão
Arremessar velas para o teu refúgio
Na chuva e embriaguez das palavras

segunda-feira, 2 de abril de 2012

907 - breve estudo para a morfologia das brisas


para a poeta Daniela Delias

teu verso é sede, visgo, alquimia
o bailado de átomos em sinergia
calmo instante de beijo da corruíra

vereda de nenúfares em fantasia
ária de bach em súbito improviso
delicado gesto na mão de nuvem

teu verso é ânsia de contemplação
um cata-vento inundado de lilases
lívida correnteza de singelo arrepio

domingo, 1 de abril de 2012

906 - Poema de olhos despertos para a senhora do destino


Nunca houve outrora para nossos laços
somos a etérea paisagem do agora
esta brisa cega de arrepios
este clamor de velas para o desatino
a pele do horizonte alucinada em arrebol