sábado, 31 de março de 2012

905 - Ária de formosura para uma geografia de cisnes


vagam girassóis em tua cerviz
adornam pelos e arrebóis
para alumbramento do beijo

corre célere a insânia do desejo
deságua em correnteza de rio
faz vertigem, viagem, delírio

vagam girassóis em tua cerviz
em repetição de ritos e gestos
neste bailado cego de comoção

sexta-feira, 30 de março de 2012

904 - Canção deserta para paisagem vespertina


Tem um vento no olho que me incendeia
Toda a brasa de um sargaço no cílio
Um mar incontinente que me separa de ti
Um caminho de velas sem rota e prumo
Há uma saudade sob este sol de outono
Que vai corroendo as minhas pálpebras
Um rio de areia esculpindo-me a face

quinta-feira, 29 de março de 2012

903 - Tango para um talvez, um quando, um há de vir


Se tu bailasses nessas cores em arrepio
Em síncope de gesto e linguagem
Talvez os passos fizessem levitação
E entrelaçando meneios no há de vir
Houvesse o quando para este alvoroço
O lugar da existência para o desvario

quarta-feira, 28 de março de 2012

902 - poeminha para uns nadas acumulados


para Nina Rizzi

alguns são os muitos
eu quase nada,
peso morto,
nuvem, pó, poeira
resquício de ventania
sobrancelha, esguelha
olho de ausência
palavra vazia

terça-feira, 27 de março de 2012

901 - ária de contemplação para paixões e afins


há um estranho mundo em tuas pernas
que eu preciso desvendar,
um recôndito de oásis a aplacar a sede
de tantos descaminhos e pretéritos
há um estranho mundo que faz visgo
que impele em cheiro meus lábios
uma morada de silencio onde
depositarei atônito todo cansaço
da existência de atroz impossibilidade

segunda-feira, 26 de março de 2012

900 - ária de contemplação para bem-me-quer ao amanhecer


tenho vestígios de iluminação nas mãos
um vestido lilás para acender as ilhas
no amanhecer incauto desta senhorinha

ela que vagueia em seu destino de mulher
para se fazer a tormenta doce do meu dia
e encarnar ventre, hálito, a louca melodia 

domingo, 25 de março de 2012

899 - poeminha para ondulação no horizonte


daquele tule de nadas
reverberam lilases
outrora eram os cimos

sábado, 24 de março de 2012

898 - poeminha de areia para vendaval marinho


afeto afoito de mar
são ondas e vagas
inventos de imersão

sexta-feira, 23 de março de 2012

897 - canção de resposta aos intentos da paixão II


deixa-me sal em tua pele
feito ácido para o desejo
para que o querer ávido
alvoroce essa tua carne

deixa-me sal em nua pele
dando trato aos temperos
de língua, suor e calafrios
à sinuosa rota de esmeros

quinta-feira, 22 de março de 2012

896 - poeminha de sede ao visgo do teu apego


tuas palavras perambulam por meu corpo
como uma ilha, um acidente geográfico
e toda vez que eu, peixe, me sinto isca
do visgo das tuas sílabas, dou tratos ao
inusitado de me postar aberto aos lábios
para não escapar deste laço, deste anzol

quarta-feira, 21 de março de 2012

895 - Antipoema para os reveses da paixão


Alimento-me desse hálito que emanas
Desse hábito de se fazer arrebol
E desapegar as estrelas e os astros
E com eles atiçar as tempestades

Crivo a sílaba da eternidade no agora
Desengano-me das velas e oceanos
Estou ilhado neste deserto sem oásis
É tanta areia nos meus olhos e passos

terça-feira, 20 de março de 2012

894 - madrigal para olhos em vertigem e alumbramento


acordei ouvindo tua voz pela casa,
estavas tão neve em teu corpo nu
cumprindo esses rituais da manhã
que não me dei conta da claridade
e saí tateando meus loucos passos

o ar me penetrava de teus cheiros
eras uma imensidão de serenidade
imersa nos lilases de suma alegoria
eu me deixei na vertigem do agora
com as sílabas do desvanecimento

segunda-feira, 19 de março de 2012

893 - canção ligeira para incitar argonautas


não há dia que eu não almeje um mar
olho para os mandacarus da caatinga
e há tanto verde para incitar as vistas

pelo chão brotam conchas na vereda
mergulham em vagas os camaleões
até os pássaros se arribam gaivotas

não há dia que eu não almeje um mar
no inerte balanço de rede na varanda
e aquele horizonte latejando de naus

domingo, 18 de março de 2012

892 - canção de ancoras despegadas em céu de maquinaria


vertigem, vertigem,
vinde comboios, estradas,
que as cercanias exasperam,
tudo range,
há na palavra flor uma pedra,
sílabas de vidro se contorcem
o homem agoniza sua sombra
enquanto retardam as bússolas
todo norte é sem horizonte
para as velas desoladas

sábado, 17 de março de 2012

891 - canção de resposta aos intentos da paixão


vou te inundar com o silencio
das minhas palavras
germinar em cada ponto do
teu corpo um jardim de sílabas
tu hás de florir para o verbo
como pétalas para o horizonte

hei de instaurar sede de consoantes
alvoroçar teu sexo com pronominais
instalar o desatino nos teus seios
numa gramática de desassossego

teus lábios ganharão reticencias
numa linguagem de lenta intromissão
as tuas espáduas serão o estuário
de conjugação das naus desavisadas

assim imbuído de solenes princípios
vou nominar teus gestos em festa
tu serás alegoria, metáfora, hipérbole
o moto-contínuo para toda a poesia
a estranha carne que me deixa desperto

sexta-feira, 16 de março de 2012

890 - Partita de entrega para girassóis e lilases VI


Ainda não é primavera, mas eu a sinto
Como eflúvio que emana do teu passo
Nesta distancia de segredos e jasmins

Apóio olhos na fidalguia do teu rosto
No solene talhe das maçãs a evocar
O delgado, obliquo, o sinuoso mirar

Ainda não é primavera, e eu me repito
Na estranha confluência dos súbitos
Da paixão que impera sobre o silencio

quinta-feira, 15 de março de 2012

889 - partita de entrega para girassóis e lilases V


antes de cerrarem-se as pálpebras da noite
e o céu regressar a sua imensidão de azul
aspiro povoar teu corpo das constelações
incitar a órbita de descaminho na via láctea

antes de cerrarem-se as pálpebras da noite
almejo os teus montes em torto desalinho
ponho-me em naus a soçobrar em teu mar
atiço os raios e trovões desta tempestade

antes de cerrarem-se as pálpebras da noite
antes de cerrarem-se as pálpebras da noite

quarta-feira, 14 de março de 2012

888 - partita de entrega para girassóis e lilases IV


Não há nada como o sonho para criar o futuro.
 Victor Hugo

hoje eu flutuei sobre as águas
como num milagre de elevação
quando as palavras me tocaram
estas que apenas em teus lábios
haverão de aplacar a minha sede

eu estarei eterno para o espanto
de te cumprir em amanhecimento
de ornar a tua fronte de alvoroço
vaguear tuas veredas em arrepio
como ulisses a retomar sua ítaca

terça-feira, 13 de março de 2012

887 - partita de entrega para girassóis e lilases III


tinhas o sabor das romãs nas mãos
quando me elevei em tuas nuvens
e percorri exangue esta nua pele
nos teus apegos e nos teus lilases

tu me vinhas embevecida de magia
como rota sutil para o alumbramento
tinhas o perfume da manhã no lábio
e o atrevimento do desejo a arrebatar

tinhas o sabor das romãs nas mãos
vinhas palavras, gestos e correnteza
vinhas como norte para os girassóis
e o teu corpo era sorriso e alvíssaras

segunda-feira, 12 de março de 2012

886 - partita de entrega para girassóis e lilases II


onde tu estavas ontem
que eu não te via
e tudo era somente
a estrada deserta
sem os teus olhos
para me fazer oásis

onde tu estavas ontem
se os lábios já exalavam
o teu cheiro de língua
e as ondas me cobriam
nesse oceano de palavras

onde tu estavas ontem
quando as perguntas
eram apenas distancias
se agora já te pertenço
e não sei mais de mim

onde tu estavas ontem
se já não há pretérito
e todos os sentidos
se ancoram em teus ais

domingo, 11 de março de 2012

885 - partita de entrega para girassóis e lilases


há impressões por toda a parte
atávicas digitais que me percorrem
o silencio corroído das maresias
aquele estranho trago das manhãs

há uma sombra indelével na tarde
que adormece o cérebro e o olhar
uma cisma de mulher que enfeitiça
os pés carcomidos pela esperança

a primavera se exaspera nos dentes
se insinua nos transeuntes coloridos
todas as estações em vivaldi ecoam
e somos nós dois a ansiar pasárgada

sábado, 10 de março de 2012

884 - para quando bem-te-vi te vir em arrebol


em cada branco setembro
viaja teu passo de ausência
velas, cobertas e tormentas
anunciam a agreste revoada

dos olhos roubou mansidão
no peito esculpiu a saudade
do querer calou-se vontade
nas asas se fez anunciação

corre-me rio em uma lágrima
fonte etérea que jamais sacia
cacos de nuvem no horizonte
vento que me alisa a epifania

sexta-feira, 9 de março de 2012

883 - poeminha de laço para a senhorinha dos lilases


para afagar o infinito
eu me debruço
em teu olhar

assim me ramifico
em odes e elegias

assim caminho
ofegante
entre as sílabas

assim concebo
as florações
do meu peito

tem muito de ti
no que há de vir

quinta-feira, 8 de março de 2012

882 - poema de velas sem ventania



quem mais sabe de mim
é este silencio enviesado
que desaba dos teus olhos

inunda-me de geografias
a terra que nunca sacia
nada edifica mas germina

como o oásis no deserto
como o peixe na penedia
como chave sem serventia

quarta-feira, 7 de março de 2012

881 - eu quero o espólio do vento


sempre desconfiei que
o canto do passarinho
era silencio regurgitado

terça-feira, 6 de março de 2012

880 - prelúdio para areia e solidão II


tua distancia me banha de esperas
caminho em ilhas, silêncios
até os espelhos oxidaram
com tanto amargor e maresia

segunda-feira, 5 de março de 2012

879 - prelúdio para areia e solidão


ando esquecido das tuas miragens
eras tão oásis nas minhas vistas

domingo, 4 de março de 2012

878 - canção distante de entardecer horizontes

a estrada cega meu pensamento
vagueia em mim tuas léguas
e o cansaço do olhar distraído
atormenta o helianto esquecido

sábado, 3 de março de 2012

877 - canção de extravio para lilases e arrebol



sou eu que aqui estou
daqui a pouco serei
apenas
pó e reminiscência
alguma palavra leve
no dorso de uma
brisa incandescente


*Dani Delias pintou aqui também lilás


você não viu o que eu vestia
os lilases que eu não tinha
porque quando poesia
andávamos mais nus

você viu aquele corte
aquela falta de sorte
aquele verso que traía
o azul daqueles dias

você ouviu aquele blues?

sexta-feira, 2 de março de 2012

876 - noturno de aparição para senhora dos alísios


há ciúme e sonho quanto te vejo
lamparinas que se acendem
desvario que se instala no peito

sopra o destino que carrego
a mão que tudo incendeia
corre ágil o frágil que me cerco

há ciúme e sonho quando te vejo
se repete o cometa em aparição
viaja o dia no suor cáustico da hora

tudo hesita e paira infindo no querer
flutua quente no olfato em tua pele
que o mar inunda e a terra treme




*A Luiza soprou junto um haikai aqui

quinta-feira, 1 de março de 2012

875 - porque eu descanso acerbo e frágil


chove, chove tanto
que eu inundo de vazios